Pensei muito, me enchi de coragem e resolvi subir. Arrumei um pretexto: "deixa que eu vou lá buscar as coisas que estão faltando". Tinha imaginado a cena completa. Você abriria a porta e se surpreenderia. Eu nem deixaria você falar nada e te beijaria. Não, não poderia ser assim. Eu diria que vim até aqui pois fiquei pensando sobre a nossa conversa de ontem. Fiquei pensando sobre como fui precipitado e tolo em te julgar por uma atitude tomada num momento de raiva. E te pediria para me perdoar e te diria que sim ainda gosto muito de você, mas que tenho medo dessa história não dar certo e de eu acabar me maxucando. Porque eu sou assim mesmo muito calculista e racional. E que aprendi muito com você, com essa sua vontade de viver a vida, mas eu não consigo ser assim. E porque somos assim tão diferentes e de mundos tão distantes é que eu penso que não vai dar certo. Mas você me convenceria de tentar. Com esse seu otimismo que irradia e que faz tudo parecer tão fácil, você me diria "o que a gente perde se tentar?" E aí sim eu te beijaria e a gente não iria para a festa, pois a nossa festa seria ali.
Mas ao invés disso, a melodia de uma música irritante. Uma letra fútil que parecia ter sido escrita para mim. Uma garrafa de champagne bebida com alguém que não era eu. Uma festa para a qual não havia sido convidado. Me senti como se tivesse caído em uma cilada. Me arrependi por ter ido até ali. E de repente me senti fora de contexto. De repente percebi que era tarde demais. Me senti como se não existisse. E toda minha racionalidade foi por terra em um ataque de ciúmes que não consegui controlar. "Qual é a dela?" Pra quê eu fui perguntar isso?!?
Certas "verdades" podem ser dismistificadas, como a localização da linha do Equador. Bastou eu olhar um atlas e procurar por ela. Agora ela me salta aos olhos cada vez que eu olho o globo. Mas outras jamais serão contestadas. Nenhuma outra versão será capaz de negar aquilo que os olhos e o coração juntos presenciaram. E a serena certeza dos fatos traz uma tranqüilidade difícil de ser expressa por meio de palavras. Mas que volta e meia retornará à cabeça na melodia de uma canção fútil ou no ringtone de um celular... thurathuru thurathuru ohh ahh, ohh ahh...
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