sexta-feira, 24 de outubro de 2014

a morte do Brasil - em 10/04/2014

È verdade que de onde tu vens, as pessoas são felizes, as praias são as mais belas, o clima é maravilhoso, faz sol o ano todo, as frutas são doces e suculentas, o povo é hospitaleiro e generoso?

Sim, é verdade. È uma terra linda. Na minha cidade, pode-se sentir a presença de Deus no encontro da montanha com o mar. O céu é azul e nele os homens voam em asas coloridas ao pular de uma bela montanha para aterrissar nas areias da praia. 

Na praia, as pessoas esquecem-se dos problemas do dia-a-dia. Basta um pedacinho de areia e o mar para mergulhar ou contemplar. Há os que praticam surfe. Alguns dos melhores surfistas do mundo nasceram no meu país. Há os que joguem uma peladinha, como apelidamos o futebol descompromissado entre amigos. Há os que inventaram o futevôlei, o frescobol, o altinho... Mas pode-se ir a praia e não fazer nada. Na praia toma-se mate gelado e come-se biscoito de polvilho. E batemos papo com os amigos. Horas a fio. Bronzeando o corpo para a noite sair de novo com os amigos para dançar, flertar. Os cariocas descobriram que o bronzeado ajuda na sedução, por isso a praia antecede a night.

Sinto-me abençoada por ter nascido aqui. Especialmente no Rio. Por que um banho de mar zera tudo. Zera o estresse, zera a uruca, zera o olho gordo, só não zera a conta bancária. É a diversão mais democrática e na praia, somos todos cariocas, independente da cor da pele ou da classe social. O vendedor de picolé, com um sorriso enorme estampado no rosto, nos cumprimenta pelo nome, lembra dos nossos filhos, pergunta por eles, e ainda oferece um desconto no sorvete, porque nos conhece de longa data.

Mas não só o Rio é maravilhoso. Já viajei muito, o Brasil inteiro é lindo. Tenho amigos de norte a sul, de leste a oeste, e em cada lugar, há algo mágico. No sul tem neve, tem festival de cinema e chocolate, tem vinho. No nordeste, acredite,  também tem vinho, de uma uva que adora o sol,  tem praias lindas e um povo amigo com um sotaque delicioso. No centro-oeste tem a Chapada, tem Bonito, tem o Pantanal...  

Então por que você foi embora?

Por que parte do meu povo é inocente ou  ignorante e não sabe eleger os governantes. Outra parte quer mudar, mas não tem forças. A corrupção tomou conta de todas as esferas. Os crimes foram banalizados. Não nos assustamos mais com a morte, apenas rezamos para que ela venha doce e não montada numa bicicleta de um pivete que nos rouba o celular. 

Além disso, há uma inversão de valores. Quem não trabalha é mais recompensado que o trabalhador. Há bolsa disso bolsa daquilo. Quanto mais filhos, mais auxílio. O presidiário, além de não trabalhar e morar de graça, ainda recebe um salário para ajudar a sua família. Salário maior que o salário mínimo de um trabalhador
honesto. Os menores de 18 anos não podem trabalhar sem autorização do estado, mas se te roubam ou se usam drogas não podem ser presos. E existem as cotas de privilégio. Se você for branco e pobre, azar o seu. No meu  país agora , é melhor que seja pobre e negro, pois assim terá fácil acesso às melhores universidades. Nada contra os negros, mas acho que tenho os mesmos direitos que eles. Agora estão a votar mais uma
cota, para privilegiar os drogados.  E fala-se em bolsa auxílio às prostitutas. 

O sistema de saúde é falido. Quem não pode pagar um plano de saúde privado é bom que tenha um anjo da guarda forte. Morre-se na fila dos hospitais ou dentro deles. Não há infraestrutura. Mas há médicos de sobra: os importamos de Cuba.

O sistema de transportes é da pior qualidade e cobram-se preços abusivos pelo serviço “des”-prestado.  Os motoristas de ônibus dirigem como se estivessem transportando carga. Não respeitam as paradas, não aguardem que as pessoas se sentem ou se acomodem. O metrô e o trem são ridículos. Atendem a pouquíssimos
bairros e andam superlotados. Ali também os passageiros são tratados como carga.

Há tanta corrupção, tanto escândalo, tanta roubalheira que não sei nem por onde começar, nem como terminar este texto. Desesperança é uma palavra que se incorporou ao meu vocabulário. Assisto diariamente  a morte da minha pátria. Pátria que  vem sendo assassinada com requintes de tortura por uma corja de políticos corruptos e por um povo burro e cego.

Eu sou patriota, antes que pensem o contrário. Resta um fio de esperança  que insiste em não se apagar. Mas deixo esta esperança nas mãos dos que ficaram. Eu não tive forças para lutar. Não tive outra escolha a não ser partir. Não dava mais. Assistir a morte de seu país é uma dor que não finda. 

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